terça-feira, 27 de agosto de 2024

Cada dia dura para sempre | Chaque jour dure pour toujours

 


foto do arquivo familiar (1972?). Rua próxima de uma das moradas dos meus pais.


Cada dia dura para sempre 

Para os amigos Caetano, Maria Antónia e Hortense


Cada dia das nossas vidas é marcado, para o bem e para mal, por pessoas, momentos e gestos, elevando-se uns mais do que outros, com consequências mais óbvias ou mais discretas, quais ondas de um mar que pode revelar-se furioso ou calmo, provocar naufrágios ou acariciar os cascos das canoas com beijos mornos. 

Uns mais do que outros, os dias decalcam-se no tempo, permanecendo latentes nas nossas vidas através de ondas perpétuas que ressoam na costa de cada nova manhã.

Também a vida dos meus pais foi sendo costurada por dias assim: A decisão de partir – primeiro o meu pai, sozinho. A travessia sofrida da fronteira, a salto (quase duas semanas de viagem); um patrão generoso à espera (com um emprego mais ou menos precário); a ida da minha mãe; os dois a vaguear pelas ruas de Champagnole à procura de uma casa melhor, o encontro. Um casal português que ao perceber a desorientação se aproximou para ajudar. Um amizade que começou para nunca mais terminar. Assim conseguiu o meu pai não só uma casa melhor, mas também um emprego melhor numa fábrica onde viria a aprender tudo o que trouxe para criar com a minha mãe, poucos anos depois, a sua empresa em Portugal. E mais importante do que isso, uma amizade, para sempre, que viria a prolongar-se nos filhos.  

Eu nasci pouco depois, já sob o amparo carinhoso de amigos feitos à custa de afectos e cumplicidades bonitas como esta. Aquela terra já não era, por aqueles dias, tão estranha. 



Chaque jour dure pour toujours 

Pour mes amis Caetano, Maria Antónia et Hortense


Chaque jour de notre vie est marqué, pour le meilleur et pour le pire, par des personnes, des moments et des gestes, dont certains s'élèvent plus que d'autres, avec des conséquences plus évidentes ou plus discrètes, comme les vagues d'une mer qui peut être furieuse ou calme, provoquer des naufrages ou caresser la coque des canoës de chauds baisers. 

Certains plus que d'autres, les jours se décomposent dans le temps, restant latents dans nos vies à travers les vagues perpétuelles qui résonnent sur le rivage de chaque nouveau matin.

La vie de mes parents a également été cousue par des jours comme celui-ci : La décision de partir - d'abord mon père, seul. Le passage éprouvant de la frontière (près de deux semaines) ; l'attente d'un patron généreux (avec un emploi plus ou moins précaire) ; le départ de ma mère ; l'errance de tous les deux dans les rues de Champagnole à la recherche d'une meilleure maison, la rencontre. Un couple de Portugais qui, se rendant compte de leur désorientation, s'est adressé à nous pour nous aider. Une amitié qui a commencé et qui n'a jamais cessé. C'est ainsi que mon père a obtenu non seulement une meilleure maison, mais aussi un meilleur emploi dans une usine où il a appris tout ce dont il avait besoin pour créer son entreprise au Portugal avec ma mère quelques années plus tard. Et surtout, une amitié qui durera toute leur vie et qui se poursuivra avec leurs enfants.  

Je suis née peu de temps après, déjà sous le soutenir affectueux d'amis nés d'une affection et d'une belle complicité comme celle-ci. Cette terre n'était plus si étrange en ce temps-là.


4 comentários:

  1. Uma fotografia, repetida vezes de mais, por esses tempos: " A travessia sofrida da fronteira, a salto (quase duas semanas de viagem); "

    Lídia Borges

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    1. Verdade, Lídia. Que tempos... Um beijinho grato pela tua leitura!

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  2. Ao escreveres desta forma, parece que nos estás a mostrar o filme de tudo o que aconteceu. E sofremos com o teu pai e com a tua mãe. E regozijamo-nos com o que correu bem. E celebramos o teu nascimento com emoção. Obrigada por partilhares.
    Uma boa semana.
    Um beijo.

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